A Cabra Cega e a Alcateia 32 da Quinta do Conde
A Cabra Cega foi ajudar o amigo Elmer a explicar a deficiência visual aos Lobitos da Alcateia 32
da Quinta do Conde.
Foi no passado dia 3 de Fevereiro de 2018 que Pedro Nogueira, presidente da Associação
Cabra Cega, escuteiro desde os 7 anos foi a pedido do seu amigo imaginário Elmer visitar a
Alcateia 32 do Agrupamento do CNE (Corpo Nacional de Escutas) 718 da Quinta do Conde que
este ano vive o imaginário “Elmer o elefante xadrez”.
Numa caçada anterior o Elmer já tinha convidado um amigo diferente pois tinha deficiência
auditiva, e na caçada deste fim-de- semana o Elmer decidiu convidar o seu amigo Pedro,
também diferente, para falar aos Lobitos e Patas Tenra sobre a sua deficiência visual como
estes tinham pedido aos seus chefes.
As dúvidas e questões sobre esta deficiência eram mais que muitas e as espectativas estavam
ao rubro. “Se ele não vê não pode ser escuteiro.” Dizia um dos lobitos à sua chefe numa das
reuniões de preparação desta caçada pensando que iriam receber uma criança.
Tal não foi o espanto quando na formatura lhes aparece à frente um cego que para além de
ser escuteiro até é chefe e lhes diz que vem a convite do amigo Elmer, um chefe que até sabia
que naquele dia por ser o primeiro sábado do mês era dia de lanchar cachorros e que foi
lanchar com eles.
Depois do lanche, sempre eufórico, fomos todos para o campo escola onde numa sala nos
sentámos em roda para que o Pedro pudesse satisfazer todas as curiosidades e responder a
todas as dúvidas e questões.
Começaram por contar aquilo que sabiam sobre a deficiência visual e apesar da tenra idade,
entre os 6 e os 9 anos, já era bastante.
Aprenderam que quando se dirigem a uma pessoa cega, e não invisual, tem de dizer primeiro
quem são para que a pessoa saiba com quem está a falar e assim logo se foram identificando e
fazendo as suas perguntas que o Pedro foi tentando explicar da melhor forma para que fossem
todas as respostas compreendidas.
L (Lobito): Não se pode brincar com um cão guia?
P (Pedro): Não quando ele vai em trabalho porque se pode distrair e fazer mal o seu trabalho
podendo colocar a pessoa em perigo.
L: Como consegues ser escuteiro?
P: Normalmente como vocês, claro que tenho de ter ajuda nalgumas coisas e tenho de ser eu a
ir ensinando aos outros escuteiros como me podem e devem ajudar.
L: Como te vestes?
P: Normalmente, não és capaz de te vestir de olhos fechados? É assim que eu me visto.
L: Como sabes as cores?
P: Às vezes dependendo da luz ainda consigo distinguir cores, mas quando não consigo uso
esta máquina que se chama colorino e me diz as cores, queres ver?
L: Que giro…
L: Como é que comes?
P: Normalmente, quem já está habituado a viver comigo diz-me como é que a comida está
disposta no prato, como se o prato fosse um relógio de ponteiros, tens a carne entre as 6 e as
9, o acompanhamento entre as 3 e as 6 e a salada ao meio dia, e é assim que sei onde está o
quê.
L: Como é que conduzes?
P: Agora já não conduzo, senão seria como os carros de choque.
(Gargalhadas…)
L: E como é que andas de bicicleta?
P: Ou ando em casa numa fixa, ou vou numa bicicleta de dois lugares em que eu vou atrás e
levo um amigo que vê à frente pra conduzir.
L: Como é que andas na rua?
P: Com a minha bengala, normalmente andamos em lugares que já conhecemos e já temos
pontos de referência pra nos guiarmos, por Ex sei que uma loja que costumo ir fica depois de
encontrar uma caixa da luz. Às vezes uso o GPS do telemóvel para me orientar o caminho e
usamos a bengala para detetar obstáculos.
L: Como é que sabes quem te está a ligar?
P: O telefone fala, ora escuta, tenho aqui dois telefones que falam, vou ligar deste e vais ouvir
aquele dizer pedro nogueira que é como eu escrevi nos contactos
L: Estou a ouvir……
L: Como é que vais às compras?
P: Ou faço as compras pela internet e me entregam em casa ou vou a uma loja e peço a um
empregado para me ajudar a ir buscar aquilo que quero.
L: E em casa como é que sabes o que são as coisas?
P: Normalmente tentamos perceber o que são com as mãos e com os outros sentidos, outras
vezes temos aplicações no telefone que nos dizem o que a câmara do telefone capta, outras
vezes usamos esta máquina que permite gravar etiquetas que colocamos nas coisas, por Ex
quando congelo bifes tenho de meter uma etiqueta destas e gravar se são bifes de peru ou de
vaca, ou por exemplo colo uma etiqueta destas no cd para saber qual é.
L: Como é que atravessas a rua?
P: Normalmente tento ouvir se não vem carro nenhum, outras vezes peço ajuda a alguém,
outras vezes os sinais luminosos também tem sons que avisam se posso passar ou não.
L: Como é que os cegos leem e escrevem?
É em braille não é?
P: Sim, normalmente é em braille que os cegos leem e escrevem, mas eu como não tenho os
dedos com que normalmente se lê o braille leio muito pouco em braille, uso quase só pra
distinguir medicamentos que são poucas palavras, acabo por escrever mais no telefone ou no
computador e leio muito no computador.
Trouxe aqui umas revistas em braille para vocês
verem como é.
L: Isto parecem borbulhas no papel…
P: Depois deixo cá as revistas e a vossa chefe dá uma folha a cada um pra levarem pra casa
como recordação.
(Sorrisos e agradecimentos...)
L: Como é que usas o computador se não vês o ecrã?
P: O meu computador está adaptado como o telefone, tem um programa que fala aquilo que
está escrito no ecrã.
Também trouxe aqui o computador para vos mostrar.
L: Podes escrever alguma coisa pra nós?
P: Claro, o que queres que escreva?
L: Escreves muito rápido, mais depressa que eu que vejo…
P: Porque já estou habituado.
L: Como é que os teus amigos reagiram quando ficaste cego?
P: A maioria bem, outros ficavam a pensar como é que me podiam ajudar e eu fui explicando,
Entre amigos não há problemas e estão sempre lá para nos ajudar se forem amigos a sério.
Estas foram apenas algumas das muitas perguntas e respostas que foram preenchendo a
nossa tarde, depois ainda enquanto esperávamos pelo jantar houve troca de animações, o
pedro ensinou o Baila Cristiano e aprendeu a palmeira numa versão diferente da que conhecia.
Depois do belo jantar, frango de churrasco com arroz e batata veio a festa da selva onde foram
vivenciadas experiências de como se conhece alguém sem ver, como se anda sem ver, como se
tem noção do espaço e do que nos rodeia, etc… e por fim como não podia deixar de ser o jogo
da Cabra Cega.
Foram bonitos os agradecimentos de todos, em especial do Xavier Afonso e do Pedro Gusmão
que falaram em nome da Alcateia em oração de agradecimento pelo dia que tiveram e as
experiências vividas e aprendidas.
Os nossos agradecimentos também à equipa de animação da alcateia pelo convite e pelo
acolhimento, em especial a Vanda Ferreira.
Cá estamos Sempre Alerta para Servir.
Já quase me esquecia, adorei o grande grito da alcateia com que fui brindado ao chegar e ao
partir, Bravos Lobitos, assim mesmo é que é.
Boa caça e não se esqueçam de ser felizes, sempre respeitando as diferenças de cada um.
Uma forte canhota